Esses dias estava assistindo a um filme na Netflix, chamado A Filha Perdida. O filme em si não vem ao caso, mas o que me marcou foi uma frase citada por uma das personagens:
“A atenção é a forma mais rara e pura de generosidade.”
Simone Weil
Pausei o filme e fui pesquisar mais a fundo sobre a frase e seu significado, e a partir daí se abriu uma caixa de pandora diante de mim! Eu fiquei maravilhada com os pensamentos dessa grande filósofa francesa do século XX, que lutava pela liberdade e dignidade humana do trabalhador operário da época. Ela não falava simplesmente da liberdade física e social e sim do direito à própria consciência e ao pensamento crítico.
“Tá, mas o que isso tem a ver com atenção?”, talvez você esteja se perguntando, então eu vou aproveitar a sua curiosidade pra tentar conseguir mais do que aquele primeiro minuto inicial que você me concedeu e que já deve estar se esgotando agora.
Seguimos então?
Voltando à frase de Simone “A atenção é a forma mais rara e pura de generosidade”, é comum pensarmos que ela estaria falando simplesmente da atenção que damos a alguém ou, pelas informações que escrevi até agora, talvez estivesse pedindo uma atenção maior do empregador para seus funcionários, certo? Mas não é esse o caso, pelo menos não nesse primeiro momento.

Simone defende que devemos prestar atenção na beleza do mundo e, consequentemente, nas experiências que nos são proporcionadas através desse olhar.
Ela descreve a natureza da vida como uma espécie de entidade pedagógica, que nos ensina através de uma linguagem de símbolos, decifrada apenas por observadores realmente atentos. Ela trata da nossa própria generosidade em recebermos os ensinamentos dessa entidade divina, em busca constante pela verdade e por nossa própria consciência.
É o olhar para fora, que nos possibilita olhar para dentro.
É aí que entra a luta de Simone pela liberdade e dignidade do proletariado, pois como seria possível que adquirissem consciência da vida e de si, sendo submetidos a condições de trabalho extremamente precárias, com cargas horárias de 18h horas diárias, impostas na revolução industrial? Era impossível olhar para fora, enquanto viviam à sombra do maquinário. Estes trabalhadores não podiam refletir ou questionar, apenas produzir calados.

Não foi mera coincidência que em 1936, mesma época em que Simone abordava este tema na França, Charlie Chaplin, lançou na Inglaterra o icônico filme Tempos Modernos, no qual eterniza a figura do operário que não consegue parar de repetir os movimentos mecânicos da atividade na fábrica. Os que antes operavam as máquinas, agora se tornavam as próprias máquinas. Mais uma prova de que a função da beleza, nesse caso em seu formato de arte, como a do cinema, nos traz de volta pra tal consciência, que a sociedade da produção em massa diariamente tenta nos fazer esquecer.
Falando em filme, acho que já deu pra perceber que eu não consegui terminar aquele filme da Netflix naquela noite. Eis a cabeça caótica de uma pessoa com TDAH!
(Pausa para a ironia da vida que é uma pessoa com transtorno de déficit de atenção, falando sobre a importância de prestar atenção. Seria isso um dos tais símbolos que a Simone falou? Bom, melhor deixar isso para outro texto).
Seguimos então?
Até agora pensamos no século XX, mas o que você acha que mudou de lá pra cá, quando falamos de ambientes corporativos, alienação, automação, robotização e falta de pensamento crítico?
Pra mim a grande diferença é que antes a alienação se dava pela falta de informação e hoje se dá pelo excesso dela. A sombra dos maquinários, que impedia a visão dos operários da época, hoje está na tela preta que carregamos pra cima e pra baixo.
Já aconteceu de você pegar o celular pra fazer algo prático, como escrever a lista de mercado no seu bloco de notas e, quando se deu conta, ficou duas horas assistindo vídeos aleatórios no YouTube ou Instagram? Eu aposto que nesse momento, você pensou na seguinte frase: “como eu vim parar aqui?”, acertei?
Antes, a informação te convidava a olhar pra fora, para depois fazer o caminho inverso, voltando para dentro e processando a informação que recebeu, criando assim um pensamento crítico.
Hoje, o olhar pra fora é quase que um caminho sem volta, com inúmeros estímulos que recebemos para continuarmos ali.
As opiniões já vêm prontas, como produtos de prateleiras que você pode simplesmente escolher, replicar e compartilhar. Os pensadores foram substituídos por influenciadores e os debates enriquecedores se tornaram apenas brigas de egos entre os profissionais de nada e os entendidos de coisa nenhuma, que acham que apenas suas verdades são absolutas.
Isso nos traz a outra questão interessante para refletirmos. Nós só conseguimos escutar o outro, depois que nos escutamos primeiro. Quando desenvolvemos a capacidade de pensarmos por nós mesmos, automaticamente estamos abertos para receber o pensamento de outra pessoa, pois entendemos que aquela opinião que formamos está, e sempre estará, passível de transformações. Entendemos que a nossa verdade não é absoluta e assim não nos sentimos ameaçados com a verdade do outro, que também não é.
A própria Simone propôs uma reflexão interessante, que podemos fazer juntos: Pense em algo que considera que seja uma verdade. Agora pense em seus contrários. Finalmente pense em como esses contrários podem ser também verdades de acordo com outras perspectivas. Um ditado famoso na filosofia oriental diz que a consciência se produz no contraste. O mesmo acontece com a arte. A junção de notas distintas é capaz de criar uma melodia, da mesma forma que um quadro é pintado com a mistura de várias cores.
Ao adquirirmos a capacidade de pensarmos de forma crítica, nos tornamos verdadeiros aprendizes da vida. Entendemos a visão coletiva como um grande prisma e desenvolvemos uma curiosidade vital pelo mistério do outro, nos propondo a enxergar o mundo com seus olhos e, em troca, oferecer a nossa visão.
Quem sabe, dessa forma, não conseguimos resolver aquele nosso problema sobre a escassez da atenção. Aquele da “pouca oferta e alta procura”, sabe? Basta implementarmos o sistema de câmbio, de troca justa. Eu te dou minha atenção e em troca você me dá a sua. Olha que maravilha! Todo mundo sai ganhando, concorda?
Dito isso, eu quero te agradecer pela sua valiosíssima atenção e dizer que também quero te ouvir, afinal essa reflexão não tem um ponto final. Ela está aberta para a sua edição a qualquer momento.
Termino, por hora, com um poema de Ruben Alves, provando, mais uma vez, que a arte e a beleza da vida estão disponíveis para que possamos voltar a prestar atenção.
“O que as pessoas mais desejam
é que alguém as escute de maneira calma e tranquila
em silêncio
sem dar conselhos
sem que digam “Se eu fosse você”
A gente ama não é a pessoa que fala bonito
E sim a pessoa que escuta bonito
A fala só é bonita, quando ela nasce de uma longa e silenciosa escuta
É na escuta que o amor começa
E é na não escuta que ele termina
Não aprendi isso nos livros
Aprendi, prestando atenção”
Seguimos, então?
O caminho para a compreensão que gera ação passa por:
- RECEBER algo que chama a sua atenção;
- SENTIR…e isso te gera um sentimento que entra em conflito ou desconforto com o que você já sabia;
- REFLETIR… o que te leva a comparar com o que já sabe ou viveu anteriormente;
- COMPREENDER… o que te faz querer saber mais e compreender algo novo;
- REORGANIZAR… e a partir daí, algo muda no seu jeito de pensar: o que era de um jeito, agora pode ser de outro;
- AGIR… de forma diferente, porque faz sentido para você.
Para isso, é preciso que cada pessoa:
- Se preocupe em deixar as mensagens mais claras, pensando no que o outro conhece.
- Busque criar conexão entre o que tem a dizer com a realidade do outro.
- Perceba o erro como uma oportunidade de ajuste para uma melhoria constante.
- Se preocupe em trazer um contexto claro para que o outro tenha todas as informações necessárias para ganhar autonomia.
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