“Como usar o storytelling para envolver pessoas” foi publicado originalmente no Brasil Post.
Há mais de 15 anos tenho ensinado pessoas como construir e usar roteiros para aumentar a eficiência na comunicação dentro do ambiente corporativo. Recentemente resolvi encarar com meus alunos um dos braços dessa ferramenta: o storytelling, esse tão comentado recurso.
Visto por muitos como uma das grandes tendências nos últimos anos, tanto no ambiente do Marketing quanto da Publicidade, o storytelling tem se propagado por muitos outros ambientes: palestras, apresentações corporativas e até mesmo em reuniões, profissionais tem tentado implantá-lo com a promessa de trazer leveza e ganhar maior atenção de suas audiências.
Apesar de todos estarmos envoltos em histórias desde a infância, poucos realmente se aventuram a entender o que existe por trás delas e porque, algumas em especial, tem o poder de nos levar às lágrimas.
Raiva, tristeza, paixão, pena, angústia, nojo. Quem já conseguiu assistir Dogville até o fim sabe o que são cada uma dessas sensações. Esse filme mexeu tanto comigo que na hora em que saí do cinema, estava com ódio do filme. Três dias depois, ainda tentava entender o que estava sentindo. Comecei a decifrar cada um dos sentimentos que o filme causa e no final de tudo, entendi que foi exatamente essa mistura de emoções que o diretor quis, intencionalmente, causar na audiência.
De forma diferente, mas tão envolvente quanto, passei 2 dias sem dormir depois de assistir Funny Games – Violência gratuita, estrelado no Festival de Cannes em 1997. Um thriller totalmente psicológico, onde você não vê nada mas pior, imagina tudo. E acreditem, imaginar é muito mais forte do que ver.
Sabe quando alguém diz pra você que viu um filme incrível, maravilhoso e que você precisa ver? Então. Você normalmente vai e se frustra. Por quê? A nossa mente é capaz de criar coisas tão fantásticas que, dificilmente, a realidade vai conseguir superar e é, justamente aí, que mora o grande segredo das boas histórias.
Quando assistimos a um filme, as imagens são capazes de nos levar aos mais diversos universos. Mas como fazer isso dentro do ambiente corporativo, onde muitas vezes você só conta com sua fala, seu corpo e um PPT (nem tão legal assim)?
1 – As pessoas precisam ver o que você está falando.
Isso mesmo, não adianta vir com palavras inteligentes, bonitas e complexas. Se as pessoas não conseguem enxergar o que você fala, dentro da mente delas, simplesmente desistem de seguir em frente.
Quer um exemplo? Recentemente me deparei com o Business Bingo. Já ouviu falar? Um artigo da Folha de São Paulo explica como jogar:

Sempre que ouvir a palavra ou expressão contida numa das casas, marque a mesma com um (X).
Quando completar uma linha, coluna ou diagonal, grite “bingo”.
Testemunho de jogadores satisfeitos:
A reunião já tinha começado há 5 minutos quando ganhei!
A atmosfera da última reunião de direção foi muito tensa porque 14 pessoas estavam à espera de preencher a 5ª casa.
O diretor geral ficou surpreso ao ouvir 8 pessoas gritando “BINGO”, pela 3ª vez numa hora.
Parece divertido, não é mesmo? Mas a verdade é muito triste porque esse jogo é resultado de anos ouvindo jargões sem sentido em momentos que poderiam ser muito ricos para trocar conhecimento e tomar grandes decisões.
Michael J. Sandel, filósofo, escritor, professor universitário, ensaísta, conferencista e palestrante, mundialmente reconhecido por seus livros Justiça – O que é fazer a coisa certa? (2010) e Liberalismo e os limites da Justiça (1982) é um ótimo exemplo de como usar histórias que todos possam ver, mesmo sem utilizar recursos visuais. Veja no final desse post um vídeo dele e perceba que todos os elementos usados em suas histórias são facilmente vistos em nossas mentes.
2 – As melhores histórias falam sobre problemas que fazem parte da realidade das pessoas.
Quer ter sucesso com uma história? Traga seu público como protagonista da situação, tentando desesperadamente solucionar problemas que o seu produto/serviço/processo, só no final, vai ajudar a resolver.
Narrativas são sobre problemas, não sobre soluções.
O grande barato é que seu público, ou seja, o personagem principal da história, sofra tentando resolver, experimente algumas alternativas, se frustre no processo e, só no final, você chega com a salvação. Se tudo for feito com bom humor, melhor ainda.
3 – Histórias aumentam a sua responsabilidade sobre o que prometeu, porque a lembrança é garantida.
O que você quer que o público saia pensando no final de tudo?
A mensagem que você quer transmitir tem que estar clara na sua cabeça mesmo antes de começar a criar a história.
E depois, absolutamente tudo da história tem que ser pensado em função dessa mensagem: o protagonista, cada situação que ele está enfrentando, o vilão. Tudo tem que ser muito bem escolhido para que no final, o público entenda que o que você está vendendo é absolutamente incrível para resolver os problemas enfrentados por seu personagem.
No fim de tudo, se você realmente conseguir contar uma boa história, pode ter certeza que seu público se conectar a você. E mais, irá lembrar dela por meses, até anos. Já diria Jerome Bruner: um fato tem 20 vezes mais chances de ser lembrado se estiver ancorado em uma história.
Perceba como o Michael Sandel envolve a audiência usando histórias fáceis de enxergar, mesmo sem aparato visual.
Esse comercial é um ótimo exemplo de narrativa baseada em conflitos: